quinta-feira, 16 de abril de 2009

Quando o jogo é desigual, a hipocrisia é regra ou é só uma exceção?

O cara, um solteirão convicto e bastante carrancudo; sempre inconformado com tudo, assistia ao jogo na tv.

O dia anterior havia sido muito conturbado para ele e, por isso, tentava uma terapia para vencer o tédio e acalmar os nervos, dispersando os seus pensamentos para outra direção.

Tivera uma discussão no dia anterior e ouvira por duas vezes e de duas pessoas diferentes, embora essas duas pessoas tivessem conivência e subserviência em suas opiniões, de que ele era uma pessoa irritante. E, para deixá-las ainda mais irritadas, respondera que quem fica irritado é que sofre mais as conseqüências do que quem irrita. Pois a pessoa irritada é uma pessoa nervosa e nervosismo é uma doença que pode alterar as tensões, desorienta e pode matar de forma súbita.

Na verdade, diriam os seus opositores que ele é quem poderia estar errado, uma vez que, duas pessoas, nesse caso, era maioria; no entanto, ele se defenderia dizendo que não estava pleiteando nenhum voto para ser eleito “o moço bom” e que em sua opinião, em alguns casos, a “maioria é burra”. Portanto, era realmente difícil combatê-lo num choque amplo e aberto de idéias. Aqueles que tentavam desistiam e, covardemente, se saíam com frases feitas ignorantes ou se calavam diante dele para, por trás, tecerem aleivosias e o discriminarem sem a devida coragem para enfrentá-lo.

Certa vez, alguém lhe dissera que ele era uma pessoa muito difícil de conviver e que provavelmente, um dia, ainda acabaria sozinho na vida.

Com o dedo em riste ele respondeu desafiadoramente e concluiu:

- Primeiro, eu não gosto de ameaças e, se isto o satisfaz pode ficar sabendo que pelas qualidades de certas pessoas que me cercam, é até um sonho que, um dia, eu venha mesmo a ficar sozinho. E completou: sou conservador e gosto do chavão defendido pelos mais antigos que diz: “os incomodados que se mudem”.

Entretanto, a pessoa que ouviu isso se calou e preferiu não retrucar.

Esse era o seu jeito de ser. Destemido, inteligente, sincero e autentico em suas convicções. Portanto, diziam que ele ofende aos outros com palavras, ao que ele sempre respondia que, palavras não ofendem ninguém, é a consciência de quem ouve o que não gosta e se ofende que os condena sem perdão.

Ademais, dizia, não posso falar só o que as pessoas gostam de ouvir, talvez seja este o meu grande diferencial que irrita, mas que também pode permitir, ás pessoas, uma oportunidade para refletir.

No entanto, somente ele sabia o quanto seu dia anterior havia sido realmente conturbado e explosivo. O alívio ele sabia bem como conseguir e, sempre que tais eventos ocorriam, isolava-se e tentava ponderar através de terapia assintomática que só ele conseguia criar e produzir.

E o Jogo já estava chegando ao final quando alguém, entrando em casa, veio lhe perguntar o porquê de não ter ido á padaria e deixado que uma pessoa, grávida, com a qual todos sabiam que ele não se relacionava devido á atritos, o fizesse debaixo da forte chuva que caía. Naquele momento, entretanto, havia mais pessoas no recinto, mas essa era a forma que gostavam de abordá-lo com o intuito de provocá-lo e assim falavam sem pensar ou sequer premeditar que poderiam não gostar daquilo que viessem a ouvir. E a pessoa então ouviu o seguinte comentário:

- Por acaso ou de fato fui eu quem a engravidei?

- Porque você mesmo não ligou para ela dizendo que quando chegasse traria o pão e assim a pouparia de ter tomado uma decisão que ela não participou a ninguém?

- E quem sou eu para deixar ou não deixar que alguém faça aquilo que é de sua vontade?

- Sabe lá você se tenho eu algum poder ou vontade sequer de influenciar nas decisões de alguém?

- E... será que essa preocupação passou tambem pela sua cabeça ou você, efetivamente, fez algum favor a outras pessoas da familia que estiveram, anteriormente, igualmente grávidas e as ajudou para que elas tivessem uma gestação mais tranqüila?

...

Por fim, não houve mais considerações feitas, pois a pessoa que o provocara simplesmente levantou-se e saiu deixando-o só e feliz com as suas reticências e o resultado do jogo que, para ele, pouco importava se fosse diferente ou terminasse igual.

Era só um jogo.

ML